domingo, 29 de setembro de 2013

do indizível

a última decisão
levantar-se e ir à cozinha
ir buscar uma maçã doce
ir sem pressa nem propósito maior
é apenas uma maçã e o cesto está cheio

uma vida passa sempre igual a todas
esquecida entre o dever dos dias
entre passos medidos

a cozinha aproxima-se
subitamente longe

quanto mede um passo
quando deus tem sede?

a maçã continua intacta
o cesto cheio e inútil

o gesto e a sede suspensos
na surpresa maior


fecho a porta firmemente
atrás dela, crescem pomares
de antiga e eterna inocência


segunda-feira, 23 de setembro de 2013

para António Ramos Rosa

fica-me nas mãos a terra que te não cobre
e nela os condicionais que semeamos
longos e lentos impossíveis

domingo, 22 de setembro de 2013

o berlinde

esse berlinde é magnífico, sim,
sei-lhe a história e o peso
sei-o todo por fora
mas é no jogá-lo
na curva que segue 
nas tuas mãos vazias
que plenamente o amo

que faz um berlinde 
em pleno meio de um silêncio

é só para isto que serve a poesia







terça-feira, 17 de setembro de 2013

pela borda do rio

arrisco tudo para não perder a sensação da última vaga antes do mar
arrisco saber depois o peso das palavras que trago nos bolsos 
arrisco a noite com mais estrelas do que aquelas que julgava capaz

não veio nunca o dia em que a borda do rio chegava 





tantas vezes estendo marés como tapetes
que a praia surge morena e lenta
é aqui que me encontras
à beira de um mar
inconsolável


domingo, 15 de setembro de 2013

sentido

creio inútil subir ao monte sequeira
tantas são as vezes que te sentas a meu lado

judia na sombra do rio limmat
vadia sem fé em terras prometidas

de amargas que são
as ervas tornam doce o pão

como uma última parte 
corpo presente

e despeço-me