segunda-feira, 31 de março de 2014

pretérito muito imperfeito

era molhar a língua nas esperanças do outro
e assim dar-lhe a beber da santa água do desejo
era comer a fome alheia e dela fazer o pão dos dias
espiga farta por entre dentes que ferem 
entre lábios demasiadamente confiantes
e da gota de sangue brotar a rosa
ou o doce espinho da dor
era derrotar a imensidão
de não ter que viver 
era a brevidade
de ter de amar
era assim

sábado, 29 de março de 2014

onda

encho-te as palavras de silêncios
como quem subitamente
vê o mar

segunda-feira, 24 de março de 2014

les sirènes hurlantes*

espero pelo dia em que terei saudades dos encontros que marcávamos
para me dares em primeira mão as tuas novas gravuras 
lembro-me de cheirar no papel o grito de sal 
em que ainda perdes os dias


*ao Manuel.

sábado, 22 de março de 2014

poids et mesure

il est léger
le silence de se laisser aimer



quarta-feira, 5 de março de 2014

o colar

um único adorno
um silêncio amordaçado

dentro dos nós, as voltas
dançam as mãos redondamente

o colo nu espera a sombra
das contas de vidro

dos verdes húmidos
da ameixa escura

losangos apertados
como esfinges

dedos hábeis
como amantes

desfaz-se o colar
na sua inteireza

rolam contas
pelo colo










segunda-feira, 3 de março de 2014

da necessidade

comem da mesma fome
bebem da mesma sede
em tudo o mais
são livres


domingo, 2 de março de 2014

do erotismo

encontra-lo na gota de rio bravo que corre livre entre as margens:

o corpo diante da bagagem desordenada

antes da viagem