sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

est-ce matière pour un poème?
lui, l'amour
je le laisse ici et je me lave les mains
dans tous ses visages ou alors
faudrait-il
dire
est-ce matière pour un amour,
elle, la poésie

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

o peregrino

partiu cedo
em vôo livre para
um lugar estranho

e volta como eu fico

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

tormenta

aucune différence maintenant
entre le jour et la nuit
Baltasar e Blimunda desconhecem-se
donne-moi une cigarette
et laisse ta main trembler

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

l'élan

le sommet n'est que la chance
de pouvoir descendre

a luz que te aproximava
da consciência do meu olhar
o espaço que não deixaste entre nós
o silêncio que cultivas com todo o cuidado,
respondeu-lhe

domingo, 26 de dezembro de 2010

coração-víscera

sangra por se ter rompido
agulha, linha e tempo
e aí tens a vida

ímpar

julgo que perdi um brinco nas tuas mãos
que farei do outro?

sábado, 25 de dezembro de 2010

sustento

do pão que dorme há vinte e cinco anos
envolto em cuidados e memórias
nasce a sombra que protege
e a água de que brotam
as espigas futuras



quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Votos para Quadra*

dado que a quadra tem apenas quatro versos
e que já gastei dois (como voam os dias, todos os deuses!) irregularmente
resta-me apenas agora desejar-te
sem nada acrescentar





*eu sei que leram "natalícia"
mas há mais do que um nascimento

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

vogar

digo-te
se te dissesse
que não consigo andar por versos
como prados e nem os prados consentiriam
pés sujos de tinta que não seja sangue vivo
de tanto andar e nada encontrar
eu também não consinto
que se suje a terra
com a boca

sou do mar

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

sebastiânimo

deste corpo ao anseio de não saber
o que houve contigo?
o que houve contigo foi o mar e o tempo
e uma imensa manhã sempre futura e sempre certa
e a tua resposta que nunca é definitiva e que espera sempre
mais um dia

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

projet de vie

le soir
je déduis les probabilités de trajectoire
pour les oiseaux qui passent
je pense à des noms possibles
pour attacher leur vol à mes doigts

domingo, 19 de dezembro de 2010

projet de vie

le matin
je jongle des cailloux et
je fais la comptabilité des pierres
qui ne nuisent aucun passant
les passants ne passent pas
les pierres sont par terre et
les cailloux sont tous
retombés

sábado, 18 de dezembro de 2010

foi uma vez

vendeu-se a sombra antiga do Mondego
o verde escuro que se via da janela
em bicos de pés e olhos altos
o merceeiro morreu e levou com ele
o nome do balcão onde as crianças se debruçavam
e pediam sonhos ou rebuçados, que diferença poderia haver?

depois, à tarde, o livro único abria os seus mistérios mais uma vez
e a história voltava a ser toda
nova

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

todos os começos são míticos
chamemos hermaion ao nosso
e que ele passe e nos roube
outra vez ainda!
a lira

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

7

par nécessité
ou par désordre
les dés que je lance
n'ont qu'une seule face
je gagne toujours
je perds toujours

je me lève de la table de jeu
j'ouvre la porte et je sors

il y a six chemins possibles
je choisis l'autre

beira-verbo

acercarmo
-nos

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

destempo

levaste contigo o poema
o pássaro e a voz

o antes já não o é

trago comigo um poema
um pássaro e uma voz
de quanto sal precisamos
para sabermos
da sede?

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

organito

la nuit est l'eau-forte où je garde
le matin

le matin se lève comme le vent,
sentimental

la tarde
cantando tangos

domingo, 12 de dezembro de 2010

o azeite que escorre da palavra
puro unto liquefeito, sente-lo?
é o mesmo que nos leva a dizer
que nenhum verbo tem prazo








Cuvée d'Appellation Partagée

ceci est l'histoire des premiers raisins de l'année
des mains qui les resseraient si fort
du vin qui ne sait pas durer


sábado, 11 de dezembro de 2010

talvez todos os dias sejam
o renascer da hora primeira
em que começámos a morrer

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

tronco comum

o ramo ainda tremia
do pássaro que lá pousou

tremeu ainda quando o vento
passou a caminho do sul

dentro de um breve momento
será galho e terra redonda

sob os teus pés

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

9 de Dezembro, sem ti*

desfiz as flores
os lírios, lírios,
E rosas também

que me deste
teci delas larvas e botões que reguei
e dos campos onde elas nascem
lavrei sóis que terão noite
apenas na estreia

quando vieres
quando eu for
subiremos nove vezes
nove vezes desceremos
os degraus cobertos de flores, rosas,
e lírios também
e entraremos enfim no palco rangente
de todas as mãos que ali se darão
em cenas de eterno improviso
e algum esquecimento
jogaremos a fingir de sérios

a divina comédia em que és apenas
o meu eterno companheiro no mais belo
engano

e se a eternidade tiver um degrau vazio
é lá que deixo
as flores que me deste, desfeitas, amadas,


nascentes


* Ademar Ferreira dos Santos: 9 de Dezembro de 1952-.
nunca
nunca mais conseguiremos
confundir as mãos e os olhos
a porta fechou-se e a janela
não tem caixilho nem vista
para o mar nosso

os dias

fazendo novelos
de fiapos de neve

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Para a María Alonso Seisdedos

não sei como lês nos dedos das mãos
as letras das canções por cantar
não sei como poderiam as estrelas escapar
do céu que enquadras no desejo
é dessa ode por começar que
celebro contigo hoje esse pedaço de céu
que sete dezembros vêem sempre chegar
seis dedos, sete dezembros e uma vida inteira

chanson volée*

tu y vas,
tu cours,
tu voles,
plein d'espoir, de claves, de tumbaos, de pregones, de flores,
de toute la musique qui vient jouer sur tes doigts
conquise,
pleine d'espoir, de claves, de tumbaos, de pregones, de flores
de ti,
tu y vas,
tu cours,
tu voles,
la vie!


*merci, EM





domingo, 5 de dezembro de 2010

Bernardo e Alberto

a janela do 4º andar abriu-se
ouviram-se passos corridos
e vozes cantadas
o sol é sempre maior
cá fora



sábado, 4 de dezembro de 2010

Un

la pause reprise en apnée
le silence repris en geste
tout le temps du monde

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Un

que pense ton sang de
la violence du geste
captif du moment

ton sang
pleure-t-il

tant

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Domicile

on te trouvera demain
et ton histoire sera publiée sous
S.D.F.
pseudonyme d'être humain

on ne t'a pas vu hier
on te trouvera demain

on a une place pour toi
on s'occupera de toi demain

tu seras abrité dans la paix des lieux
il y aura du silence, tu dormiras sans peines
ni froid
ni rien

tout l'après-demain


sarabande

suite de bonheur intact
pour improvisation tentée
et trois temps jamais trouvés
ce n'est pas le même mot
ce n'est jamais le même poème
cette variation n'était pas prévue


terça-feira, 30 de novembro de 2010

1:1

incompreensível
esse acorde que não passa de um
que não resulta em melodia
que nunca será canção
que trauteamos sós
surdamente e em
uníssono

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Un

sur le vieux bois
le temps danse sa fin
avec joie
on y retournera encore
une fois
le temps danse sa fin
de ce pas

domingo, 28 de novembro de 2010

não se vê
essa corda que me tange
em mil pedaços
sei quem foste
porque nunca mais
achei o caminho de volta

meio-paraíso

faltou-nos um jardim
e uma árvore impossível
de abraçar toda e
a outra metade
que eras tu
ou era eu

sábado, 27 de novembro de 2010

crescendo

je sais de toi
la joie et la fureur
le temps d'une corde frappée
le temps d'un double échappement:
rejouer avant de jouer et entendre l'espace entre tout cela!
art vivbrant aux abords de l'éternel
oubli!

Eternity and the Saints

je grave tout ce que tu veux
sur l'eau

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

descobres a meio da viagem
uma embarcação imóvel
e um porão aberto ao sol
debaixo dele
debaixo de tudo
andam os mistérios do fundo
do mar de ti e de tudo o que é azul
desse azul ao sol que não sufoca não cala
antes brilha brilha brilha alegremente
debaixo dele
debaixo de tudo
saem as marés das manhãs do mundo

Stein et moi

une femme est

une femme est

une femme est



je m'appelle Ana

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

não sei como hei-de chamar
a terra que tem nome de riacho
é tão pequena que cabe num batimento
surdo
é tão pobre que nem os sonhos por lá passam
e morrem
é tão bela que todos os bandonéons choram
se a não tocam
dizes que já tem nome
Riachuelo
mas não é esse que lhe quero dar

trilhos

o eco dos dias
não é comparável
ao da montanha

só os peregrinos
e os aventureiros
são felizes

Un

l'écoute et l'abandon
jouent ensemble
comme des vieux amis
comme des nouveaux amants
diminuo-te como posso
vou-me embora como
sempre fui e como
nunca voltei
estando
a recusa de fazer
colaborou ternamente
com a vontade de ser

terça-feira, 23 de novembro de 2010

la fenêtre ne donnait pas sur la mer
il faut que tu comprennes

domingo, 21 de novembro de 2010

intervalo

nada houve
nada haverá
tudo apenas é

sábado, 20 de novembro de 2010

après-midi

la mercerie vient d'appeller
la commande de la laine
elle est arrivée


désolée
ce n'est pas moi
les mains qui transforment le froid en amour


ce n'est pas moi
mais je veux bien vous passer une commande
même si je ne sais rien tisser juste faire des petits noeuds
que le vent défait
toujours

l'inconnue raccroche
et le fil retrouve mes mains

blanc

la fenêtre s'ouvre mais
les draps sous le soleil bas
dorment encore
rêvent encore
du jour

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Dissociation

cette fois on sera deux
et je sentirai exactement
le fond des notes du coeur
tes parfums avant les miens

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

no dia em que Bartolomeu morreu

a terra prometida, José
visita-se na jangada azul-céu
esse pássaro imenso da utopia

é Domenico quem sustém a tonalidade
beliscando cordas virginais
A e B
tangendo sete-luas
e sete-sóis

a terra prometida, José
encontra-se dentro e perto
nos lugares que a Vontade ama
o caminho à volta do lago
desenha os gestos que os pés
refazem e que os olhos esqueceram

há caminho para além do lago
mas a água estende-se tanto, demais
haverá só tempo de aprender a ser flor

na borda da margem,
a dor

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

nascem flores, nasce gente
faz-se história
debaixo do silêncio dos teus olhos



leçon de rythme

que ta musique fait ses débuts
dans mon coeur!
on dit tempo?

terça-feira, 16 de novembro de 2010

geratriz

a tua beleza é quase a alegria
de quem não ouve abismos
no canto dos pássaros

não há abismos
no canto dos pássaros

há apenas as mãos
de onde nascem as
elipses terrenas

e a tua beleza
e ter poesia que desse para um verso só

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

o verso correu a linha e acabou por escorrer do papel
agora é apenas tinta que a chuva refez
a materialidade do sonho
enfim!

domingo, 14 de novembro de 2010

paume de temps

l'orange s'est retrouvée à nouveau
ronde
dans la main de l'homme
dans la main de la femme
ronde aujourd'hui
demain aussi
demain
qui?

linha 8, 0:34

a flor é esperavelmente vermelha
a palavra arde na pele
a mão é dura

é sábado

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

fragmento

cabes na parte de mim
que ama e que é em mim
o amor teu em vida minha
le regard qui sème le feu
est lui-même braise
et les mains coupables

le regard qui sème le feu
est lui-même le vent et la pluie
et les cendres qui me forgent

trouve-moi la métaphore



se pudesse agora
seguir o teu olhar
pousá-lo-ia no meu

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

azul noite

só os náufragos
conhecem o mar

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Un

tous les lendemains
le savent très bien:
le bonheur vient
de terminer

dis-le moi
demain

Um

sei que nos encontraremos sempre
para os lados da terra que tem nome de riacho
exactamente a meio
de um caminho
sem chão

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

paris, outono

quem ouve o agitar da primavera em novembro
julga que a última volta que dão as folhas
antes de morrerem no chão
é poesia

e o vento que as levará
é ainda canto

e o arrepio súbito dos ramos
é desejo, ainda

sábado, 6 de novembro de 2010

se vieres por cá
traz um dia seguinte
qualquer

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

entre as nossas mãos
a pedra-rosa-mar
vive do tempo
esquecida

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

nunca viajaste tanto
se soubesses por onde andas!
os braços em que te faço cruzar
os corpos que contorno até cair
e todas as praças em que me deito
perto da terra do chão em noites frias
as palavras que roubo de esticão e que afinal
estavam vazias
pobres, todos!
e as palavras que ponho como moedas nos lábios incautos
de quem não ouve
e até as portas que abro do lado de fora e as janelas agora sempre
viradas ao relento
e só não te fiquei com a televisão porque jamais admitiria a notícia da tua morte
e amanhã, onde vamos?

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Un

tout est vrai
de cette vérité
étrange
tout en silence
le réel
avec sa peau
et ses larmes de feu
se bat contre l'oubli

ne dis plus jamais
illusion!
tout est vrai

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

quando o teu silêncio se torna intolerável
falo eu
e invento-te ainda e só mais uma vez

domingo, 31 de outubro de 2010

la route

enlève tout
deviens l'âme
avant le souffle

sábado, 30 de outubro de 2010

la douleur

l'homme-arbre regarde la mer
le vent passe
est passé

O Regresso

pede-me a fuga
e o esquecimento
e traz-me contigo
de volta a mim,
a nós

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Un

nos coeurs se touchent
nos fronts se touchent
nos corps se suivent
la vie est un détail

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Roubo

nada sustém a concha das mãos,
fora a ilusão do amparo do rosto*

* María Alonso Seisdedos

a concha das mãos serve de único abrigo ao desamparo de ser
e um verso serve apenas para fingir que as linhas
inacabadas valem mais
como se ali no fim arbitrário (a arte é uma mentira!) houvesse mais verdade! poderia continuar a repetir esta vacuidade até à exaustão das linhas ou do tempo mas acho que me fiz entender, especialmente por quem não me lê, são esses os melhores leitores, os que virão, e além disto, não posso
continuar
(verso isolado, verbo isolado, e a negativa a pungir tudo!)

e a concha?

Costas

o problema da infância
é ela pouco ou nunca acabar

terça-feira, 26 de outubro de 2010

da injustiça

a vontade é redonda
bem vês que não me serás espelho
e eu não serei vale para o teu canto


esse ouro forjado a mil-mãos
será entregue a alguém que
talvez nem precisasse

muito
tu sais que le bonheur consiste
presque exactement
à prendre le dernier métro

après tes bras

domingo, 24 de outubro de 2010

Un

ce lieu là, ce centre
la rencontre là où
on ne peut que
être un

j'explique

ce lieu là, ce centre
la rencontre là où
on ne peut que
être un

demain

si on avait le temps
de s'étonner que
c'est fini


les enfants sont où?
ils jouent à
perdre de vue

sábado, 23 de outubro de 2010

perguntas ao relojoeiro

se o coração falhar um compasso
passará a bater desacertado
do tempo primeiro
em que sentiu?

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

se o sol pairar baixo
podemo-nos enfim decidir
a apanhá-lo mais à frente
antes do poente

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

dada a perturbação extrema
resta-nos morrer ou viver
ou amar
ouve o canto dos teus dedos nos meus e diz-me
se não seria desejável haver um nicho de eternidade
onde coubessem inaudíveis as linhas que agora me desenhas
j'aime toutes les syllabes
que tu prononces sans
hâte

j'aime attendre le mot
et le monde
dedans

puis
partir

terça-feira, 19 de outubro de 2010

cheiras a intransigência
e eu prefiro sempre
o odor da mudança
como a chama
ou
a folha
que o vento
apenas deixou pousar

domingo, 17 de outubro de 2010

Un

raconte-moi doucement
les mémoires d'un ailleurs
qui m'appartient,
même s'il est le tien

n.b.

desmaiam as rosas nas nossas mãos
que é como quem diz
desfolhámos cruelmente o tempo

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

poème presque invisible

petite vie
petite mort
petite vie

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

dentro

fui-te buscar à estação
hoje
não vieste
nenhum comboio te trouxe
e todos os carris desabaram

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Un

tout ce qui nous sépare
c'est-à-dire
la vie et tous ses jours
la route et ses chemins

est aussi ce qui garde l'instant
de pleine connaissance
aussi mystérieuse
que le nombre de lignes sur tes mains ou
que le nombre de tes pas
vers moi
(en toi)

par exemple,
un fruit entier tout entier
qui ne l'est plus

c'est-à-dire

nous

domingo, 10 de outubro de 2010

Un

j'aurais dû te dire
une fois pour toutes
sans que jamais tu ne l'entends
que ceci n'est pas un tango

Un

tu as l'heure?
c'est maintenant,
le bonheur?
on marche un peu
nulle part?
on tourne en rond
sur nos pas?
on fait semblant
que ce n'est rien?

et après,
c'est quand qu'on vit?

Instante

do rumo dos pássaros
nada se sabe
apenas que passaram

sábado, 9 de outubro de 2010

O mar de Moledo*

vem lenta a onda
e como tem tempo
torna ao mar


e tornada se fica
sempre a chegar


vem lenta a onda
e como tem tempo
torna ao mar


*das fotografias de María Alonso Seisdedos

da Vida

e de quem nunca soube
fazer laços à corda
apenas nós

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Un

je ramasse les heures comme
des fruits tombés trop tôt
de l'arbre

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

petit poème rouge
brûle tant
petit poème noir

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Un

au sol
bien au sol
le pied avoue
ne pas pouvoir
ne pas aimer

terça-feira, 5 de outubro de 2010

rasgada a pele num traço que lhe serpenteia o gesto
resta-me o teu olhar
que tudo refaz

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Portrait

le trait révèle la main qui l'a dessiné
cette courbe, cette ligne plus épaisse ici
plus fine et tremblante là et ce choix inquiétant
de prendre tout de la source et de ne plus savoir le chemin
de retour



tu sais que je ne finis jamais mes lignes
je te prouverai cela
un jour

poder sempre ter o teu peito como garante de abrigo e liberdade
sentir o mundo por ti e em ti e fazer disso uma causa de luta
pela qual morressem muitos
e ficassem tantos ainda
para contar
o meu direito
a ter-te aqui

domingo, 3 de outubro de 2010

Un

être au plus profond
l'intérieur du centre
la totalité
toda

sábado, 2 de outubro de 2010



palavra osso
palavra sangue
palavra vida
ela
que vem e que passa
(e às vezes anda longe)
ela
sempre material e
impoética

impossivelmente
poética

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

começo hoje o mês concordando
com o calendário. é que hoje
é um primeiro dia

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Un

cet écart
dit d'une demi minute d'arc

(nous)
est désormais en place



quarta-feira, 29 de setembro de 2010

nuit blanche

sur les pierres immenses de l'église
l'ombre conjure un goût de cerise
qu'aucune lèvre pourra renier
le marbre s'adoucit juste
pour que les corps
puissent enfin
prier

terça-feira, 28 de setembro de 2010

o que fazes do mar
e dos pássaros
e de todos os voos


cabe impossivelmente
apenas em ti


seis dedos
e um sonho



domingo, 26 de setembro de 2010

deux

je retiens de toi le noir
sur ta peau trop blanche
c'est peu comme portrait
et pourtant, tu sais
tu dois le savoir
(comme moi)
c'est tant

a pergunta?
claro que a ouvi
respondo amanhã

sábado, 25 de setembro de 2010

Un

je reviens toujours
et tu restes toujours
laissons muet
le désordre du sujet

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

se te sigo ou se te continuo
é uma questão de acertar
o nosso eterno
descompasso
por ora
fica aí

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Un

comprendre ce minimum
que
je transpire ta peur
je bats ton coeur
avec mes mains
que
je donne mon corps
pour y entendre
tes échos

que rien ne suffit
que tout est trop
je garde l'
entre-nous
de ce côté là

22/09/2010
Les Quais

terça-feira, 21 de setembro de 2010

quando mentes
ainda és tu
e a tua mudança
de factos e sentidos
o teu olhar preparado
a inflexão treinada da voz
a saliva que voluntariamente
muda sábados em domingos
és sempre tu

ficciona-me

domingo, 19 de setembro de 2010

ah, o rio!
o mar! ah, o mar!
e ninguém repara
que é apenas ângulo
que é ser dia e estar sol
que é haver margens e horizonte

Un

est-ce entièrement ma faute
si la seule envie que j'ai c'est de
passer, être là, de l'autre côté
là où les mystères de ta peau
se révéleraient dans mes mains

est-ce entièrement ma faute
si j'aime tant
cette frontière

sábado, 18 de setembro de 2010

cette terre que tu réclames
son impossible liberté
ses bords ouverts
aux pieds errants
elle n'existe que là
dans ce chemin étroit
de notre humanité

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Alice

se olhares com muita atenção
verás que a luz do sol é negra

e que só os olhos devolvem
a verdade que procuras

se olhares com muita atenção
verás que te falta ainda

o outro lado

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

biografito-me
nesta parede que
está de passagem

couvre les yeux
avec tes deux mains
et pleure le sort du fils du fleuve



segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Un

tu sais que dire que nous donnerions toute la vie
en échange d'un moment
du moment
c'est dire
encore
peu

Un

cet amour des fleurs
et des orages d'été
la soif de l'infime
la soif d'infini
l'apprentissage
du moment
fini déjà

domingo, 12 de setembro de 2010

Un

être seuls dans la foule
et dire sans mot que le monde
se refait dans tes bras

sábado, 11 de setembro de 2010

se viver te parece difícil
experimenta a morte
morrer é tão mais fácil
o gesto é pequeno
e único
único

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

esse solo em que estás
não é o solo em que vives
lavo o erro com o teu sangue
e somos sempre mar futuro

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Express Insulaire

ce soir
je mange des olives
à l'honneur de tes yeux
et je me noie tranquillement
dans leur improvisation de marée

terça-feira, 7 de setembro de 2010

vens pelas ruas desprotegido de ti
a chuva faz-te parecer sozinho
mas os teus dedos molhados
contam outra história
a minha

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Un

à l'intérieur de cette musique
il y a un coin qui ne sait
que s'abandonner
à nous

domingo, 5 de setembro de 2010

Un

ce pas au-delà
ce temps suspendu
jusqu'à ce que l'on apprend
de nouveau à respirer
ce limite à chaque fois poussé

si l'on ne voit plus le vertige
est-ce le gouffre?

sábado, 4 de setembro de 2010

Un

je resterais là encore
quatre fois encore
à l'abri du monde
pour écouter
quatre fois encore
pas l'orchestre
pas la danse
j'écouterais
quatre fois encore
l'alternance
à quatre
de nos coeurs

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

ainda não chegou o tempo
da claridade se decidir
a ser luz

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Ocre

tes syllabes s'insinuent dans ma langue
avant de se perdre sur mes lèvres
se te visse passar num sonho
pedia-te um gole de água
e as tuas mãos em concha

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

laisse tomber
ce qui est dans tes mains
ouvre-les bien
écarte les doigts
longuement
et viens
le silence nous berce
nous allons d'ici à l'aube
peut-être ensemble
peut-être un

terça-feira, 31 de agosto de 2010

autobiografia

herdei a necessária mania de cortar
roupa velha para fazer panos novos

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Ocre

aride et chaude
cette terre se prête
à tout laisser renaître
car le corps de soleil
a la voix d'eau

Ocre

comme un nouveau-né
tu cherches une première heure
l'heure unique où le sang est encore entier
et le lait et le sein débordants de tout l'amour

Ocre

tu épuises la vie à l'intérieur de toi
l'obséssion est centrale
galiléenne



domingo, 29 de agosto de 2010

adiarei sempre o inevitável
só mais um dia
é certo
vives

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

A Merisi

d'où est venu ce lézard innocent
du plaisir de sa morsure
et ce garçon tant
coupable

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

sei como leste a palavra
não é preciso dizeres nada

gostamos da amálgama
entre o cacho e as uvas

e da mão que colhe

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A Merisi

falta-me poder saudar Mateus
e o seu anjo dobrado em silêncio

faltam-me os sinos a montante
belos de um canto sem deus

falta-me a distância impossível
e o teu chamamento




A Merisi

a terra deu-te o nome
uma espécie de punhal
cravado nos sentidos

assim viveste

(22/08/2010)

A Merisi

et on peint la transparence avec des couleurs opaques
et on souligne la douleur à l'intérieur du plaisir
et on drape tout toujours d'un rouge
irrefusable

(20/08/2010)

terça-feira, 24 de agosto de 2010

double

dans le rêve de l'après-midi
le soleil se confondait avec la lune et
je voulais y aller et
j'y suis allée
dans la vie
toute chose belle
est simple

sábado, 21 de agosto de 2010

o pin que eu compraria

tous les voyages
sont vrais
mon ami
par exemple,
là maintenant

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

A Merisi

pertences ao contorno escuro do sol
Jesus render-se-ia e com ele traria
as uvas e os montes e o grito
que não chegou a dar
evita entrar no lugar onde se jogava a vida
evita as luzes e as vozes que sangram
sempre que as olhas

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Recado

nao disponho de acentos
para te fazer umas linhas
desde a cidade eterna
do tempo
disponho dele como
se ele fosse todo

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

são apenas pedras e desenhos
são apenas pessoas
umas vivas
outras mortas
tudo parte de ti
nada de novo
nada de novo
conta-me antes
o que partilhas com Aquiles

domingo, 15 de agosto de 2010

todos os caminhos de volta a Roma
passam pelos teus braços
a vida demora e
leva-me

sábado, 14 de agosto de 2010

Guia Turístico Completo

Caravaggio fica entre
Apolo e Dionísio
lado poente

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

ao largo

já lês mar alto
como se fôssemos
criaturas pequenas

mar-ventre

e o céu fosse poder
ver terra e gente

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

respirer

oui, les minima

tes mains sur les miennes

ton corps sur le mien






quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Raízes

disse-me o oráculo
que as pedras têm o sabor
que a terra lhes empresta
que as mulheres
ou os homens
são terra
que quer ser pedra

terça-feira, 10 de agosto de 2010

um pequeno medo derrotado
ainda que ao fim do dia
larga a correr contar
a hora que é nova

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

da história que durou toda a noite
retive as migalhas de luz, as gotas
que Penélope roubou a Ulisses

domingo, 8 de agosto de 2010

do sete passado
haverá contas futuras
sorris, talvez
é impossível a felicidade
não ter um tom qualquer de azul
e se não for azul
será esse lampejo líquido
que te assoma aos olhos

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

je viendrai à l'aube d'un rêve imprévu
pour pousser le lendemain avec toi

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

adianto-me um pouco ao abraço das ondas
estreito um pensamento que te seria familiar
se o teu cais fosse chão de mar
a mãe d'água acolherá a milonga dos oceanos
e toda a poesia que aqui não está

terça-feira, 3 de agosto de 2010

je m'éloigne un peu
ce peu qui te rendra ma liberté
comme si je pouvais par un jour humide
respirer près du miroir
qui nous a créés

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

homicídio involuntário

se me chamaste na rua e eu parei e para ti olhei
isso não quer dizer em nada que saibas o meu nome
sou como tu composta de mistérios voláteis
e se a tua mão se demorou um pouco mais no meu braço
isso não quer dizer em nada que saibas o meu corpo
invocas um passado que eu já não reconheço
mas sorrio e deixo estar
já não sei quem és
mas sorrio

domingo, 1 de agosto de 2010

domingo

refez-se a onda na outra que começava
e com ela enrolou o mar numa história
que continua a chegar

sábado, 31 de julho de 2010

va vers le sommet
sans oublier
qu'après lui
il faut descendre
va vers l'amour
mais garde bien
l'annonce de sa fin

ou reste là





sexta-feira, 30 de julho de 2010

je récupère le vol de cet oiseau
que tu as arrêté d'un seul regard

il me pèse
il chantait, ce fils du temps?

je le délivre à son passage












quinta-feira, 29 de julho de 2010

estava no sítio errado
ali não era a tua casa
a tua casa está vazia
a tua casa é agora
todo o ar e
toda a terra
nela jogamos (e pode ser
que se ganhe este aos deuses!)
e pomos as balizas longínquas
à nossa altura e desfolhamos
espigas improváveis e quentes
e rimos com a curva da estrada
para lá de todos os caminhos sabidos

quarta-feira, 28 de julho de 2010

antes das seis

soarão passos para ninguém ouvir
e a mulher virá sem que ninguém a espere
vejo que traz uma pedra que se lembrou de ser flor
e cinco dedos vazios e abertos ao vento que não se esquece
de passar

terça-feira, 27 de julho de 2010

saída de cena
e o palco ainda com a luz
de todos os olhares amorosos

segunda-feira, 26 de julho de 2010

genealogia

percorri as montanhas do Atlas contigo
para ver como nascem as rosas
que depois secam

domingo, 25 de julho de 2010

senta-te aqui e atreve-te a ouvir a frequência surda
de quem apagou todos os passos
para dar lugar ao caminho

sábado, 24 de julho de 2010

le vide prend ses formes
l'oubli fait son cinéma
les personnages sont assis
je les ai surpris, ils mangeaient
ils étaient en train de faire leur vie
rien d'excessif sous ce soleil qui pourtant
pourrait nous réduire à un simple fil d'eau
perds-toi, Ariadne

sexta-feira, 23 de julho de 2010

contrariamente a todas as expectativas
a donzela abriu a porta dos fundos e saiu
sabe-se pouco de quem ficou à janela

quinta-feira, 22 de julho de 2010

estava muito trânsito
a meia-noite veio mais cedo
o fornecedor de virtualidade
foi jantar e encontrou um amor perdido
e deixou cair a rede e mais algumas defesas
o cão comeu um fio
os degraus de acesso a casa desapareceram
(terá sido o cão?)
chego atrasada
hoje

terça-feira, 20 de julho de 2010

je commence par ne pas savoir
comment continuer et je crois même
que la continuation elle-même ne fera que
reprendre ce point de départ en ajoutant
peut-être, je ne l'ai pas encore décidé, que
je ne sais que commencer

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Nous

dans ce voyage il y aura un train
et la chaleur extrême des rails
au passage du wagon

domingo, 18 de julho de 2010

contei todos os segredos a quem não os pôde reconhecer
e inventei-me de maneira a não me encontrar nunca mais
livre de mim, sobrou-me o mundo e mais um dia

,

disfarcemo-nos de qualquer coisa ilícita
e enganemos a única obscenidade da vida

oficiosamente
e quase silenciosamente
gosto do aspecto que tens hoje
se contigo me cruzasse numa rua apertada
tão apertada que tivessem os teus dedos de roçar nos meus

oficialmente
e quase historicamente
os meus dedos roçaram um dia nos teus
e ainda ardem nas páginas de todos os livros que não escrevemos

sábado, 17 de julho de 2010

retroperspectiva

chegava com atrasos variáveis a todos os encontros
um dia atrasou-se muito mais do que o habitual
e não chegou
apenas porque
já o deves suspeitar
não havia ninguém à espera

sexta-feira, 16 de julho de 2010

on n'aime que l'attente
le voici
le mouvement qui
brise le silence
il crie si fort
si fort

quinta-feira, 15 de julho de 2010

por uma vez
o homem sorriu
espécie de contentamento
por deixar que a luz morta das estrelas
lhe servisse ainda de tecto
e de colo

quarta-feira, 14 de julho de 2010

K87 L33

não se trata de um voo
é mais um passeio que
não parece desconcertar
nenhuma árvore da raiz
nenhum instante ao tempo

les compositeurs

le groupe était aussi improbable que toi
baltasar et blimunda, bartolomeu et domenico
que je perdrais dans les couloirs de ta maison de terracota
où je me suis retrouvée en plein soleil à midi sans bien savoir
qui étaient les personnages qui rêvaient de moi

terça-feira, 13 de julho de 2010

caiu um dos galhos
do ninho alto
e ninguém sabe
que rumo levou
se terá chão agora
se será abrigo
de um bicho pequeno
um que tenha resolvido parar
e pensar um instante nos humanos

segunda-feira, 12 de julho de 2010

je me déplace à cet instant
où le passé vient savourer
le futur, ce lieu
magique

domingo, 11 de julho de 2010

Milonga

elle a les yeux comme le feu
qui a brûlé toute la nuit
ce feu qui aime la pluie
la fin d'une histoire
qu'elle raconte bien
le regard cambré
sur moi
e se hoje te contasse alguma história
seria a de uma outra pessoa qualquer
todas menos eu que já não te faço falta

sábado, 10 de julho de 2010

je te donne rendez-vous
un peu avant le centre du bonheur
à l'heure précise où tu ouvriras ta main
pour que j'y trouve la mienne

sexta-feira, 9 de julho de 2010

não havendo mais matéria
abra-se a vida
na primeira página

quinta-feira, 8 de julho de 2010

garde un peu du sable
que tes pieds aiment tant
il sera là par un jour d'hiver
où aucun oiseau ne chante
ce jour-là
regarde bien tes poches
ou le petit coquillage
entre-temps
oublié