adiantei-me meia hora
não importa ao que venho
troco a carta do coronel
por trinta minutos de ficção
troco a história de um país
pelo coincidir das nossas mãos
abrimos uma pizzaria apenas
para podermos mandar os convites
Amanhã, A Grande Estreia!
Amanhã, Começamos
tudo nos é dado desde agora
permitido, por meia hora
chamamos os cães
montamos os cavalos
está uma montanha inteira
há meia hora à nossa espera
segunda-feira, 17 de dezembro de 2018
domingo, 9 de dezembro de 2018
Da tua viagem*
para que iria invocar anjos ou estrelas
se passas num rumor de ferrovia
como a saudar-me de perto
a distância que sabias
desço, desta vez,
deixo que o comboio vá
deixo que me peças que fique
e troco as voltas ao destino
falo-te da passagem pelo Atlântico
do Inverno porteño
da seda a roçar o punho aberto
voando numa sala em Montserrat
da felicidade totalmente inútil
do sentir-tição
as marcas vivas que Camões não vê
Montserrat,
Barrio del Mondongo
sabemos que todo o conhecimento
é inútil, que pôr nomes às coisas
é inútil como já não estares
é não saberes
que estremeci quando passou o comboio
sem saber em que carruagem te encontrar
se passas num rumor de ferrovia
como a saudar-me de perto
a distância que sabias
desço, desta vez,
deixo que o comboio vá
deixo que me peças que fique
e troco as voltas ao destino
falo-te da passagem pelo Atlântico
do Inverno porteño
da seda a roçar o punho aberto
voando numa sala em Montserrat
da felicidade totalmente inútil
do sentir-tição
as marcas vivas que Camões não vê
Montserrat,
Barrio del Mondongo
sabemos que todo o conhecimento
é inútil, que pôr nomes às coisas
é inútil como já não estares
é não saberes
que estremeci quando passou o comboio
sem saber em que carruagem te encontrar
* Para o Ademar Ferreira dos Santos
9-12-1952(-22-05-2010)
sexta-feira, 7 de dezembro de 2018
Porcelana e papel*
traduz-me isto
que nunca se faça tarde
para subir de novo a montanha
e uma e outra vez reconhecer as árvores
o estranho corte redondo na encosta
e a casa que habita os sonhos
e de onde se parte
sempre
que nunca se faça tarde
para subir de novo a montanha
e uma e outra vez reconhecer as árvores
o estranho corte redondo na encosta
e a casa que habita os sonhos
e de onde se parte
sempre
*para a María Alonso Seisdedos
domingo, 2 de dezembro de 2018
18, calçada de santa apolónia
caravela, barcarola
rumo certo e acabado
água mar
pedra mágoa
sal granito
sonho largo
roda do leme
rosa dos ventos
aonde me levas
se aqui me tens?
rumo certo e acabado
água mar
pedra mágoa
sal granito
sonho largo
roda do leme
rosa dos ventos
aonde me levas
se aqui me tens?
domingo, 4 de novembro de 2018
Transfusão
abro uma veia na terra
e outra em mim
os caminhos
sabem-no
ouve o sulco que se forma
à passagem do rio
por essa terra
rasgada
seiva lenta
demorada
língua quente
nos teus braços
no teu pulso
no teu pulso
ritual conhecido
de quem sente que o tempo se aquieta
para ver melhor
quem o toma
golpe fino e doce
como romãs
veio húmido e doce
como romãs
coração ferido
de vida
coração ferido
de vida
sábado, 3 de novembro de 2018
Osso
olhos-oceano
quebra e une-se
corpo-árvore
alma-forte
mil anos mais
não me perguntes
mas são mil anos mais
quebra a vida num instante
de pleno sentido
assim és, sou
quebra e abre um nicho
onde só cabe o fogo imenso
do começoquebra e une-se
como as mãos que juntam
pedaços caídos de porcelana rara
mil anos mais
nunca me perguntes
mas são mil anos mais
sábado, 27 de outubro de 2018
el agujero
janelinha pequena
umbral onde repousavas
a alinhar imperfeições
como para caberem
na mala do olvido
ou
som que parece água
de um céu clemente
de nuvens e vento
azul-sol
sem religião
ou
ver-te sempre
em tudo
todo
segunda-feira, 22 de outubro de 2018
El Vals de Tanturi
emigrei apenas para poder dizer golondrina
emigrei apenas para te ouvir dizer golondrina
modulamos timbre e saliva e aproximamos os lábios
emigrei apenas para te ouvir dizer golondrina
modulamos timbre e saliva e aproximamos os lábios
terça-feira, 16 de outubro de 2018
ponto e linha
a liberdade seria sair à rua neste preciso momento
e não regressar a nenhum lado nunca mais
segunda-feira, 8 de outubro de 2018
No fim do mundo
empunhavas um simples quadrado de seda branca
um quadrado livre e redondo como a queda da lua
nos braços da manhã, quando a luz se insinua
por dentro dos medos e os faz enfim
descansar
nada resiste à certeza da manhã
nada resiste ao gesto breve
de começar
as palavras nascem
e olham-se pela primeira vez
e levam nelas o corpo todo do tempo
que as cala e encerra dentro dos teus lábios
como numa arca que eu pudesse completamente abrir e
saquear
acto único de pirataria selvagem tantas vezes repetido
até ser acto primeiro, final!
o sal imenso dos teus lábios
mudamente nos meus
não cala nada
não esconde nada
saqueio o que posso, mas fere-me a luz da seda branca e
rasgam-me a pele as arestas das pedrarias que roubaste sem piedade
e o sangue sabe-me ainda a mar e aos teus olhos no leme de não sei que vida
fecho os olhos e abro as mãos e de novo me surges como o dia novo, a ilha clara
talvez se esperar a manhã se acabem as palavras e o tempo nelas e nosso
devolvo-te o quadrado de seda branca
borda-lhe, se queres, a realidade
um quadrado livre e redondo como a queda da lua
nos braços da manhã, quando a luz se insinua
por dentro dos medos e os faz enfim
descansar
nada resiste à certeza da manhã
nada resiste ao gesto breve
de começar
as palavras nascem
e olham-se pela primeira vez
e levam nelas o corpo todo do tempo
que as cala e encerra dentro dos teus lábios
como numa arca que eu pudesse completamente abrir e
saquear
acto único de pirataria selvagem tantas vezes repetido
até ser acto primeiro, final!
o sal imenso dos teus lábios
mudamente nos meus
não cala nada
não esconde nada
saqueio o que posso, mas fere-me a luz da seda branca e
rasgam-me a pele as arestas das pedrarias que roubaste sem piedade
e o sangue sabe-me ainda a mar e aos teus olhos no leme de não sei que vida
fecho os olhos e abro as mãos e de novo me surges como o dia novo, a ilha clara
talvez se esperar a manhã se acabem as palavras e o tempo nelas e nosso
devolvo-te o quadrado de seda branca
borda-lhe, se queres, a realidade
segunda-feira, 1 de outubro de 2018
La certitude
paira, pousa e desaparece
em voos inexplicáveis
levando-nos
eco perdido
no fundo de nada
ainda que a tua boca
me grite mansa o contrário
ce jour-là...
ainda estou para saber
como reúne a tua língua o espaço
e o tempo que certeiros nos acabam
em voos inexplicáveis
levando-nos
eco perdido
no fundo de nada
ainda que a tua boca
me grite mansa o contrário
ce jour-là...
ainda estou para saber
como reúne a tua língua o espaço
e o tempo que certeiros nos acabam
quinta-feira, 27 de setembro de 2018
Passagem de Alfredo Ábalos
à sede que se enreda na voz
às cordas que lhe gravam fendas,
às penas, caminhos e omissões,
saúde!
tudo isso fica do lado de cá da porta
onde os rios correm com o cio
de sempre chegarem ao mar
abismo de sentir em copla
o que não pode tardar
terça-feira, 11 de setembro de 2018
Âmbar
dezassete dias passados
agosto inverno
três meses
depois
o pátio
receberam-nos um gato e
um manequim quebrado
por entre ramos verdes
de não sei que
primavera
a sala era azul
de um azul anoitecido
na memória del tiempo aquel
quando a moldura não te encaixotava
no pó vago dos lugares altos e inúteis
e não sei em que movimento das horas
se voltou a encher de azul a sala
mas de um azul âmbar
nicho-fonte que me albergou
na curva abismo da noite
na curva abismo do caudal
nascente como
resina
hoje recebem-nos no pátio
um coração-insecto
e os rios frescos
do olvido
agosto inverno
três meses
depois
o pátio
receberam-nos um gato e
um manequim quebrado
por entre ramos verdes
de não sei que
primavera
a sala era azul
de um azul anoitecido
na memória del tiempo aquel
quando a moldura não te encaixotava
no pó vago dos lugares altos e inúteis
e não sei em que movimento das horas
se voltou a encher de azul a sala
mas de um azul âmbar
nicho-fonte que me albergou
na curva abismo da noite
na curva abismo do caudal
nascente como
resina
hoje recebem-nos no pátio
um coração-insecto
e os rios frescos
do olvido
segunda-feira, 10 de setembro de 2018
No Fim do Mundo
é ainda terra
a última que piso
antes do mar eterno
é ainda dia, o sol que baixa
e nos revela juntos na espera
lento Outono, feroz Primavera
caminho pela terra do fogo
com a cadência que me deixaste
um instante de cada vez
uma vida de cada vez
impossível sul
baía adentro
último adeus dos yagáns
ao poder dizer refúgio
cálida maneira
calada maneira
de te saudar
a última que piso
antes do mar eterno
é ainda dia, o sol que baixa
e nos revela juntos na espera
lento Outono, feroz Primavera
caminho pela terra do fogo
com a cadência que me deixaste
um instante de cada vez
uma vida de cada vez
impossível sul
baía adentro
último adeus dos yagáns
ao poder dizer refúgio
cálida maneira
calada maneira
de te saudar
terça-feira, 21 de agosto de 2018
segunda-feira, 20 de agosto de 2018
quarta-feira, 15 de agosto de 2018
Impermanência
Despojar-se completamente
Golpe finíssimo
A fingir de carrasco
Proclamação surda
Primeiro dia da derrota dos dias
Memória desfeita nas tuas mãos
E era o começo de tudo
Ou um tiro final
Também serve
A saia de seda desliza
Uma única vez até ao chão
Casulo asa
Mulher
Desliza o chão e a noite
Por fios de uma seda eterna
Que importa, quem conta
Se calamos ou dizemos
Asilo-nos num país improvisado
E desfias-me as fronteiras
Asilo-nos num país improvisado
E desfias-me as fronteiras
Golpe finíssimo
A fingir de carrasco
Proclamação surda
Primeiro dia da derrota dos dias
Memória desfeita nas tuas mãos
Tudo acabou
Chão larva momento
Por isso te conto
Sempre novo
Desato o nó
Desato o nó
Desliza a seda
História de um país mulher
terça-feira, 14 de agosto de 2018
Tormenta
Não é que não ame as bagas grossas de chuva
e as fendas de luz que rasgam a noite
mas como se atreve a natureza
a pôr-nos assim
em palco!
e as fendas de luz que rasgam a noite
mas como se atreve a natureza
a pôr-nos assim
em palco!
segunda-feira, 13 de agosto de 2018
domingo, 12 de agosto de 2018
49*
Conta-los um a um
Compasso de sangue
Espera lenta
Matriz mãe
Amarga
Desse sangue cantado
Sobram-te as veias e a garra
Noites a querer guardar o tempo
E bordas de tangos que mal aguentam
As mil quedas em que te precipitas
Desse arresto tentado
Sobram-te os voos redondos
E o passo amoroso em 4 ou 8 ou 16
Que o mestre sempre te quis livre
Tempo de um mate quente
Que se sorve lento
Ideia inviolável
Um corpo inteiramente vivo
Matéria breve
Célula mãe
Nascida
Dia arrebatado às cinzas,
Este
Compasso de sangue
Espera lenta
Matriz mãe
Amarga
Desse sangue cantado
Sobram-te as veias e a garra
Noites a querer guardar o tempo
E bordas de tangos que mal aguentam
As mil quedas em que te precipitas
Desse arresto tentado
Sobram-te os voos redondos
E o passo amoroso em 4 ou 8 ou 16
Que o mestre sempre te quis livre
Tempo de um mate quente
Que se sorve lento
Ideia inviolável
Um corpo inteiramente vivo
Matéria breve
Célula mãe
Nascida
Dia arrebatado às cinzas,
Este
*Para Jorge, depois do transplante.
sexta-feira, 10 de agosto de 2018
quarta-feira, 8 de agosto de 2018
No espelho
de tão lenta, fugaz
sem antes nem depois
esta é a história de uma fotografia
instantâneo de vida por revelar
em película pele
sem antes nem depois
esta é a história de uma fotografia
instantâneo de vida por revelar
em película pele
segunda-feira, 6 de agosto de 2018
vão-nos deixar sem nada
vão-nos tirar o pão da boca e a boca e o pensar nela
e os beijos que matavam a fome e geravam motins
e o motim maior que devora o pensar e o saber
e fica só assim a sentir a destempo
e o tempo, o tempo
o tempo
ontem
ou noutro dia qualquer
passei em frente do Coliseu
o concerto tinha definitivamente acabado
a rua e as paredes estavam miseravelmente sombrias
e ontem, ainda ontem, abri devagar as tuas mãos por nelas
vagar o sol
é pouco, tão pouco, fui apenas o movimento redondo dos teus olhos
quando ao chegares
parti
não nos vão tirar mais nada.
vão-nos tirar o pão da boca e a boca e o pensar nela
e os beijos que matavam a fome e geravam motins
e o motim maior que devora o pensar e o saber
e fica só assim a sentir a destempo
e o tempo, o tempo
o tempo
ontem
ou noutro dia qualquer
passei em frente do Coliseu
o concerto tinha definitivamente acabado
a rua e as paredes estavam miseravelmente sombrias
e ontem, ainda ontem, abri devagar as tuas mãos por nelas
vagar o sol
é pouco, tão pouco, fui apenas o movimento redondo dos teus olhos
quando ao chegares
parti
não nos vão tirar mais nada.
quinta-feira, 26 de julho de 2018
Desde El Alma*
o momento vaga perdido
roda como quem quer voar
e assim redondo se lança num vals
que os meus braços não deixam acabar
só isto te posso prometer ainda que
já não saibas durar
mas há ainda chão e o maestro
ainda nos sabe escutar
sigamo-lo no vals perdido
prestes a começar
* À memória de Nicolás Ferreira, no dia do seu aniversário.
sábado, 21 de julho de 2018
navegantes
estremecemos
entramos na curva do vento
passamos por entre cortinas
de água e lábios de sal
a terra desliza inteira
e nela alamos
desvios
talvez nos percamos
da rota imensa
talvez a seta
seja o anzol de um pescador
que ilumina a noite no Ginjal
talvez a parede roída de tempo
nos ampare a queda mil vezes
calço os sapatos cor-de-poente
e entro na curva do vento
estremecemos
entramos na curva do vento
passamos por entre cortinas
de água e lábios de sal
a terra desliza inteira
e nela alamos
desvios
talvez nos percamos
da rota imensa
talvez a seta
seja o anzol de um pescador
que ilumina a noite no Ginjal
talvez a parede roída de tempo
nos ampare a queda mil vezes
calço os sapatos cor-de-poente
e entro na curva do vento
estremecemos
segunda-feira, 16 de julho de 2018
prestidigitadores
nas suas mãos
há apenas ocaso e olvido
a eterna corrida alegre passando
o umbral de todas as manhãs
no horizonte sempre além
no horizonte de toda a vida
ser um pouco mais à frente
sobra um passo
o próximo
sempre
há apenas ocaso e olvido
a eterna corrida alegre passando
o umbral de todas as manhãs
no horizonte sempre além
no horizonte de toda a vida
ser um pouco mais à frente
sobra um passo
o próximo
sempre
poema póstumo
bani lembranças
corri a memória
abro a janela e o livro sem medo
não me vens deitar a cabeça no colo
não me vens deitar a cabeça no colo
quarta-feira, 4 de julho de 2018
da pertença
pouco se sabe
do poder que tem um verbo
de mudar o caminho das marés
ainda menos se sabe se aquele pouco de som
que assistiu na difícil tarefa de propor aos lábios
que algo é dúctil
ou fero
sobrevive ainda às amarras da língua tua
no corpo mundo
Sur
talvez os gatos tenham sete vidas
pássaros e gente têm
apenas uma
voo único
de um céu rasante
volta sem memória
ao princípio de tudo
toda a vida
toda uma vida
tempo de apenas deixar
que a areia escorregue
por entre os dedos
até ao chão
pássaros e gente têm
apenas uma
voo único
de um céu rasante
volta sem memória
ao princípio de tudo
toda a vida
toda uma vida
tempo de apenas deixar
que a areia escorregue
por entre os dedos
até ao chão
quarta-feira, 27 de junho de 2018
O anel
o extraordinário punho
apoteose e fim
creio no rosário
contas de pele
fantasia redonda com
deus de permeio
saqueaste o mar
ferreiro e forja
e eu prata
sopro
corte fundo
corte fundo
estamos ainda
ambos no mundo
na terra húmida dos
sonhos enterrados
travessia cega
mar nocturno
recolho-me náufraga
chega-me o teu eco
se nascesses agora
apoteose
e fim
segunda-feira, 25 de junho de 2018
Garras
era assim que começavam as linhas
que não cheguei a escrever
rasgava setembro
cinco dias
inteiros
domingo, 24 de junho de 2018
monarca
acabou-se a música
arrancaram o chão
todos se foram
sobra um acorde
que nada cala
tríade menor
de dois
dentro
lá fora
os corações pequenos e os notários, juntos
conferem gravemente da inutilidade de assim bailar
pois não há música nem chão nem nada que nos justifique
e nem o confessado assomo do amor aos lábios que tudo estremece
basta
decretam o fim da memória
e do seu esquecimento
insisto
houve um chão
houve música
houve gente
lá fora
recolhem diligentemente as flores caídas
retiram as coroas e os laços para um lugar conveniente
onde tudo será cinza depois da última porta fechada pelo lado de fora
calada alquimia entre fogo flor e lágrima
dentro
a homenagem acabou
decreta-se o retorno
ao real
lá fora
o voo transatlântico da borboleta
cruza com espada de ferro as vossas crenças
quarta-feira, 20 de junho de 2018
Borda
sucessão e ordem
passam os dias
(aquele momento
engoliu o tempo todo)
sucessão e ordem
passam os dias
passam os dias
(aquele momento
engoliu o tempo todo)
sucessão e ordem
passam os dias
Trasnochando
vem o teu passado ter comigo
num gesto mal medido
num golpe fero
interponho-me
atrás, a máquina do tempo
coreografa tudo
peço a palavra
por um ausente
gesto breve
que te cuida
abro a arca
corpo fechado
houve um tempo
em que te esperava
as veias abertas em teu nome
atrás, a máquina do tempo
coreografa tudo
peço a palavra
por um ausente
gesto breve
que te cuida
abro a arca
corpo fechado
houve um tempo
em que te esperava
as veias abertas em teu nome
quarta-feira, 13 de junho de 2018
Legado*
que importância tem o depósito sentimental
das coisas a que chamo tuas?
amanhã virá o executor
reafirmar que já não és
dono de nada
tudo nos foi legado, repartido em
tecidos vivos de memórias
histórias e sentir
o corpo amargo
o corpo amargo de
não sentir a vontade do teu
também ele nos foi legado
omphalos a quem faltasse
o cordão original
corte inútil
marca tua
eu, que te criei
tu, que me nasceste
somos parte eterna de tudo
e seremos ouvidos
convoco o executor, o carrasco e o criador
para traçarmos juntos o plano destes trinta dias
a mais
faço ver que a roda que movíamos ao contrário do tempo
pode agora avançar e que te espero no Goya às seis da tarde
sujeitos ao céu aberto e à terra fremente
sem mais abrigo que o querer
rejeitamos mortalhas e milagres
trinta dias é um breve estremecer
nas cordas eternas da vida
fecho-te os olhos com os meus
amparo-te a queda
recebo-te
das coisas a que chamo tuas?
amanhã virá o executor
reafirmar que já não és
dono de nada
tudo nos foi legado, repartido em
tecidos vivos de memórias
histórias e sentir
o corpo amargo
o corpo amargo de
não sentir a vontade do teu
também ele nos foi legado
omphalos a quem faltasse
o cordão original
corte inútil
marca tua
eu, que te criei
tu, que me nasceste
somos parte eterna de tudo
e seremos ouvidos
convoco o executor, o carrasco e o criador
para traçarmos juntos o plano destes trinta dias
a mais
faço ver que a roda que movíamos ao contrário do tempo
pode agora avançar e que te espero no Goya às seis da tarde
sujeitos ao céu aberto e à terra fremente
sem mais abrigo que o querer
rejeitamos mortalhas e milagres
trinta dias é um breve estremecer
nas cordas eternas da vida
fecho-te os olhos com os meus
amparo-te a queda
recebo-te
*poema para refazer o dia 14 de Maio de 2018,
para vos.
segunda-feira, 11 de junho de 2018
Chico
são muito azuis, os olhos que não vi
é nossa, a cidade maravilhosa
submersa nos futuros amantes
que não sabem que nada
é p'ra já
tomo-lhe as palavras
levo-as a tempo
nós sabemos
tudo já foi
tudo será
caem milénios
neste momento em que
não criamos nada
recebemos tudo
poemas azul-buarque
lenço azul-amante
que deixaste cair
é nossa, a cidade maravilhosa
submersa nos futuros amantes
que não sabem que nada
é p'ra já
tomo-lhe as palavras
levo-as a tempo
nós sabemos
tudo já foi
tudo será
caem milénios
neste momento em que
não criamos nada
recebemos tudo
poemas azul-buarque
lenço azul-amante
que deixaste cair
sábado, 9 de junho de 2018
100 metros
começaste a não estar há tanto tempo
que o momento exacto de não estares
parece-me aquela imperceptível aceleração
que faz com que apenas um ganhe a corrida
corremos todos atrás de ti e reconhecemos a tua vitória
ficámos para trás e agora andamos a passo a recolher os possíveis
talvez te lembres que te dizia ter começado a entender passos e rotações
talvez tenhas entendido que toda a felicidade está em começar e nunca em ganhar
ainda assim,
aceleraste.
que o momento exacto de não estares
parece-me aquela imperceptível aceleração
que faz com que apenas um ganhe a corrida
corremos todos atrás de ti e reconhecemos a tua vitória
ficámos para trás e agora andamos a passo a recolher os possíveis
talvez te lembres que te dizia ter começado a entender passos e rotações
talvez tenhas entendido que toda a felicidade está em começar e nunca em ganhar
ainda assim,
aceleraste.
teoria de tudo
ao encontrar todos os valores possíveis
resolvo a incógnita, reponho a verdade
x igual a tudo o que é possível
x igual a si próprio
x nada
depósito de ossos e sonhos
a terra resolve todas as equações
na mais perfeita e longa igualdade
a alma cabe dentro de um saco plástico
o anseio cabe todo dentro de seis letras
a vida é um rio que se ri à gargalhada
das nossas reflexões na margem
sábios de calças arregaçadas
ponderados no sofreramar
jodorowskys a martelo
joderowsky para os pobres
olhos redondos de quem diz
que anda por aí uma incógnita solta
e a cala para parecer mais alto quando anda na rua
x não é igual a um metro e talvez oitenta de jactância
muito mais gosto, ó terra, de quem sabe
que nunca houve mais nada a saber
vão, vêm, estão
x = matar-nos
há
resolvo a incógnita, reponho a verdade
x igual a tudo o que é possível
x igual a si próprio
x nada
depósito de ossos e sonhos
a terra resolve todas as equações
na mais perfeita e longa igualdade
a alma cabe dentro de um saco plástico
o anseio cabe todo dentro de seis letras
a vida é um rio que se ri à gargalhada
das nossas reflexões na margem
sábios de calças arregaçadas
ponderados no sofreramar
jodorowskys a martelo
joderowsky para os pobres
olhos redondos de quem diz
que anda por aí uma incógnita solta
e a cala para parecer mais alto quando anda na rua
x não é igual a um metro e talvez oitenta de jactância
muito mais gosto, ó terra, de quem sabe
que nunca houve mais nada a saber
vão, vêm, estão
x = matar-nos
há
sexta-feira, 8 de junho de 2018
paisagem
apoio a minha vida no torso que me recebe
faço-lhe frente e respondo-lhe surdamente
a partir daqui é só caminho e juro-te
atravessámos montanhas
não to disse ainda?
regressa.
torso corda larga de guitarra antiga
os teus dedos na curva onde começa o corpo
consolo breve por sermos dois
chamamento perto
esteio
torso esteio largo
encosta e precipício
regressa.
sei que um pouco mais à frente
de golpe, sem aviso
a paisagem muda
tangente de dentro de não sei que demónio
raso a parede cheia de falhas agrestes
e a montanha segura de há pouco
é agora rocha impassível
e vertigem
e vertigem
regressa.
do sangue não nascem flores
e se nascessem seriam rosas carne
espinhos arrependidos de todo o mal
sonhos fulvos de uma manhã de outono
ainda intactos
regressa.
e se nascessem seriam rosas carne
espinhos arrependidos de todo o mal
sonhos fulvos de uma manhã de outono
ainda intactos
regressa.
terça-feira, 5 de junho de 2018
⧜
rogo a memória alheia
que te traga até mim
eras muitos
quero que sejas mais
desses pedaços faço história
que gravo nos olhos de quem me olhar
pouca gente o sabe
mas vivemos tudo sempre
bastou que uma vez
o tivéssemos sentido
mas rogo, sim, rogo,
a memória alheia
que te conte
mais
neste eterno baile
preciso ainda e sempre
que sintas comigo
que sintamos juntos
os acordes de um passado
que vivemos, que temos de ter vivido
cada vez que caminh⧜mos
ao contrário do tempo
só mais uma vez
contame
que te traga até mim
eras muitos
quero que sejas mais
desses pedaços faço história
que gravo nos olhos de quem me olhar
pouca gente o sabe
mas vivemos tudo sempre
bastou que uma vez
o tivéssemos sentido
mas rogo, sim, rogo,
a memória alheia
que te conte
mais
neste eterno baile
preciso ainda e sempre
que sintas comigo
que sintamos juntos
os acordes de um passado
que vivemos, que temos de ter vivido
cada vez que caminh⧜mos
ao contrário do tempo
só mais uma vez
contame
segunda-feira, 4 de junho de 2018
domingo, 3 de junho de 2018
sábado, 2 de junho de 2018
Epitáfio
ir apenas quando se acabassem os sonhos
ir depois do último desejo
ir sem pena
tenho o teu epitáfio por escrever
teimas em viver
escondo a data e baralho as horas
entro no comboio de madrugada
entro na paisagem onde estás
os monstros são claros
deixam-se acariciar
penso que talvez seja
uma estranha passageira
que se levanta a meio da viagem
e sonha que sai do comboio em andamento
para entrar no gelo branco e quente do desconhecido
está gente à tua espera
faltaste ao ensaio
e ao dia
há quem encerre desejos como se fossem portas
há quem guarde sonhos com papel de embrulho
há até quem deite fora as penas
às segundas, quartas e sextas
junto com o lixo doméstico
indiferenciado
e diga ele
e não tu
a gente que te espera
guarda o tempo que te faltava
para chegares ao fim de todos os sonhos
não se escrevem epitáfios com fios do real
bem atados a quem somos
aqui não jaz
ninguém
ir depois do último desejo
ir sem pena
tenho o teu epitáfio por escrever
teimas em viver
escondo a data e baralho as horas
entro no comboio de madrugada
entro na paisagem onde estás
os monstros são claros
deixam-se acariciar
penso que talvez seja
uma estranha passageira
que se levanta a meio da viagem
e sonha que sai do comboio em andamento
para entrar no gelo branco e quente do desconhecido
está gente à tua espera
faltaste ao ensaio
e ao dia
há quem encerre desejos como se fossem portas
há quem guarde sonhos com papel de embrulho
há até quem deite fora as penas
às segundas, quartas e sextas
junto com o lixo doméstico
indiferenciado
e diga ele
e não tu
a gente que te espera
guarda o tempo que te faltava
para chegares ao fim de todos os sonhos
não se escrevem epitáfios com fios do real
bem atados a quem somos
aqui não jaz
ninguém
quinta-feira, 31 de maio de 2018
Ara
as palavras carregam
a madeira que pisaste com todo o sentir
e o gesto brutal que no-la arrancou
rasgo dentro de mim o verbo
que a reduza a pó ou
que a guarde
as palavras carregam
o incenso que sobe até ao Sul
e o altar onde não me deito
rasgo dentro de mim o verbo
que cale a missa de um ou
que te cante
as palavras carregam-nos
peso-mundo
vão
Cartografia
assoma já a onda que nos vai quebrar a todos
rodo o compasso calmamente
posição estimada
adentro
por isso, navego calmamente contigo
não me chegou nenhuma data
nada sei desse mar por vir
não me preparo
um dia
visitou-me nitidamente
a tua futura ausência
corria a madrugada
e nela chegava a
presença audível
do teu abraço
no meu peito
assomava a onda que nos vai quebrar a todos
convoquei Magdala para que nos afundássemos juntas
na voz de Laborde lobo náufrago eterno
cabeça simplesmente na almofada
adormeci
não me preparei
não sabia
acordei num dia completamente novo
e rodei o compasso pelo gozo da roda
assomava-me o teu nome aos lábios e aos dedos
temos todos a mesma idade nesse primeiro dia
meço a onda pelo cruzamento de distâncias
concluo que nos afogamos
nascemos no mesmo mar que nos há de quebrar
la última noche
el punto final
corria a madrugada
e nela chegava a
presença audível
do teu abraço
no meu peito
assomava a onda que nos vai quebrar a todos
convoquei Magdala para que nos afundássemos juntas
na voz de Laborde lobo náufrago eterno
cabeça simplesmente na almofada
adormeci
não me preparei
não sabia
acordei num dia completamente novo
e rodei o compasso pelo gozo da roda
assomava-me o teu nome aos lábios e aos dedos
temos todos a mesma idade nesse primeiro dia
meço a onda pelo cruzamento de distâncias
concluo que nos afogamos
nascemos no mesmo mar que nos há de quebrar
la última noche
el punto final
rodo o compasso calmamente
posição estimada
adentro
terça-feira, 29 de maio de 2018
20 watts
reparaste
o mundo encolheu
o mar secou
o coração
besta mecânica
galopa sem freio
debate-se
não entende
paredes brancas
agarra-se
ao seu próprio som
dança ainda uma vez
e esperança-se
descremos os dois
reparaste
do fim
mundo rochedo
fio de sal
os físicos postulam
que o meu tempo e o teu
existe existiu existirá
descremos todos do fim
o coração
besta mecânica
galopa, desmedido
e esperança-se
mundo grão
gota
nada a fazer
dano irreversível
máquina desligada
off
por 20 watts
o coração
grão
gota
pó
domingo, 27 de maio de 2018
Salavina
espero pacientemente
que o piano de Ariel Ramírez
nos não acompanhe assim
nos não fira assim
boca de mar imenso
engolindo o correr dos dias
que o piano de Ariel Ramírez
nos não acompanhe assim
nos não fira assim
boca de mar imenso
engolindo o correr dos dias
El Maipú
mudaram o chão onde caminhavas
a madeira guarda tudo, como nós
tábuas de prazer e mágoa
pedaços de vida
entram os moços inocentes na sala
vêm recolher o que é apenas chão
rasgado e irregular
não serve já
não sabem
ainda bem
carregam tudo rapidamente
não há tempo a perder!
não há tempo a perder
temo-lo ainda todo
pedaço-chão
inteiro
a madeira guarda tudo, como nós
tábuas de prazer e mágoa
pedaços de vida
entram os moços inocentes na sala
vêm recolher o que é apenas chão
rasgado e irregular
não serve já
não sabem
ainda bem
carregam tudo rapidamente
não há tempo a perder!
não há tempo a perder
temo-lo ainda todo
pedaço-chão
inteiro
sábado, 26 de maio de 2018
quinta-feira, 24 de maio de 2018
só assim se pode dizer:
morir de amor
morrer de morte lavrada em auto, não
morrer de homenagens derradeiras, não
morrer de lápide e fotografia, não
afasto todas as mãos que não te cuidam
mordo quem de ti se abeire de cara tapada
escorraço coveiros e comadres
mato os abutres
convoco deus
o teu
digo-Lhe
morir de amor
era esse o único plano
era esse o único plano!
depois, um dia, sim, morrer apenas
da morte de decidir a cor do caixão
da morte que guarda relíquias em gavetas
da morte que chora, recorda e depois esquece
morir de amor é a única morte possível
a única que sabíamos
a única que dizíamos
tempo adentro
digo-Lhe
este é o nosso mistério
nunca O alcançarás
morir de amor
morrer de morte lavrada em auto, não
morrer de homenagens derradeiras, não
morrer de lápide e fotografia, não
afasto todas as mãos que não te cuidam
mordo quem de ti se abeire de cara tapada
escorraço coveiros e comadres
mato os abutres
convoco deus
o teu
digo-Lhe
morir de amor
era esse o único plano
era esse o único plano!
depois, um dia, sim, morrer apenas
da morte de decidir a cor do caixão
da morte que guarda relíquias em gavetas
da morte que chora, recorda e depois esquece
morir de amor é a única morte possível
a única que sabíamos
a única que dizíamos
tempo adentro
digo-Lhe
este é o nosso mistério
nunca O alcançarás
terça-feira, 22 de maio de 2018
Improviso para te levar ao baile*
viajo para a frente
estou prestes a ler o improviso
que arrancarias destes estranhos dias
vou a tempo de te dizer que não é verdade
que me fuja sempre o pé para a dança do adjectivo
vou ainda a tempo de te contar Paris de luz apagada
Paris sem Prévert nem Blake
cegos ambos para olhos de mar que me tragam
songs of innocence and of experience
Paris sem tangos cantados a meio da tarde no boulevard
incessantes partidas e portas fechadas
estou a tempo de te contar
e esperar pelo que vais tecer
que andei pelos cantos do Sul
que saberias reconhecer
excepto um
o nicho perfeito, a pele quente
o compasso de espera
antes
* Para o Ademar Ferreira dos Santos
09/12/1952 - 22/05/2010
estou prestes a ler o improviso
que arrancarias destes estranhos dias
vou a tempo de te dizer que não é verdade
que me fuja sempre o pé para a dança do adjectivo
vou ainda a tempo de te contar Paris de luz apagada
Paris sem Prévert nem Blake
cegos ambos para olhos de mar que me tragam
songs of innocence and of experience
Paris sem tangos cantados a meio da tarde no boulevard
incessantes partidas e portas fechadas
estou a tempo de te contar
e esperar pelo que vais tecer
que andei pelos cantos do Sul
que saberias reconhecer
excepto um
o nicho perfeito, a pele quente
o compasso de espera
antes
* Para o Ademar Ferreira dos Santos
09/12/1952 - 22/05/2010
segunda-feira, 21 de maio de 2018
7 noites
ainda não
nesse dia (pela manhã?) acordaste
como todos os dias
e levantaste-te
corria o massacre em Gaza
escreviam-se poemas sobre o massacre em Gaza
escreviam-se poemas sobre o violentíssimo desaparecimento da Realidade
faltavam palavras para falar dos que tombavam
a menos que nos explodisse o peito
nesse dia corria o dia de hoje
a Realidade avisava
esse dia é hoje
recebo os pedaços do teu peito
recebes tu os meus
no mundo possível da manhã do dia catorze
recuemos um pouco
treze de Maio
tranquila me dizia
se me tivesse inquietado
se me tivesse pressentido num dia como o de hoje
se me tivesse prevenido com as teorias e postulados dos Mundos Possíveis
e te tivesse gritado para não me deixares ver o dia de hoje vinte e um de Maio?
se pudesses ver como o princípio do tempo se parece tanto com o seu fim
a rapariga com olhos de caleidoscópio que encantou os alunos esta manhã chama-se
Lucy (in the Sky with Diamonds)
o Miguel que veio da Galiza, como a María, dá-me versos sem querer, pão amargo para a boca
daquele mate parecido com o gosto da tua língua na minha
na camisola do petiz enamorado esta manhã lia-se LEIBNIZ em grandes letras nas costas
ainda o filósofo a rondar-nos com todos os seus mundos possíveis às costas
e nós que lhe damos razão porque
ouve:
como teria Leibniz imaginado que chegaríamos aqui
a este amargo dia sem mate
sem ti?
nesse dia (pela manhã?) acordaste
como todos os dias
e levantaste-te
corria o massacre em Gaza
escreviam-se poemas sobre o massacre em Gaza
escreviam-se poemas sobre o violentíssimo desaparecimento da Realidade
faltavam palavras para falar dos que tombavam
a menos que nos explodisse o peito
nesse dia corria o dia de hoje
a Realidade avisava
esse dia é hoje
recebo os pedaços do teu peito
recebes tu os meus
no mundo possível da manhã do dia catorze
recuemos um pouco
treze de Maio
tranquila me dizia
se me tivesse inquietado
se me tivesse pressentido num dia como o de hoje
se me tivesse prevenido com as teorias e postulados dos Mundos Possíveis
e te tivesse gritado para não me deixares ver o dia de hoje vinte e um de Maio?
se pudesses ver como o princípio do tempo se parece tanto com o seu fim
a rapariga com olhos de caleidoscópio que encantou os alunos esta manhã chama-se
Lucy (in the Sky with Diamonds)
o Miguel que veio da Galiza, como a María, dá-me versos sem querer, pão amargo para a boca
daquele mate parecido com o gosto da tua língua na minha
na camisola do petiz enamorado esta manhã lia-se LEIBNIZ em grandes letras nas costas
ainda o filósofo a rondar-nos com todos os seus mundos possíveis às costas
e nós que lhe damos razão porque
ouve:
como teria Leibniz imaginado que chegaríamos aqui
a este amargo dia sem mate
sem ti?
domingo, 20 de maio de 2018
Arresto Doble
bailavas essa redonda privação da liberdade
sempre pela última vez
cerceando a minha
rodeando o meu espanto
com afagos que queimavam
caminhavas como quem grita
coroavas como quem ama
para logo te afastares
tímido agora
tantos e tantos anos de palco
e a modéstia inteira
mas onde quer que eu te visse
aquele chão era teu
todo teu
a liberdade era minha
toda minha
arresto doble, corazón
sempre pela última vez
cerceando a minha
rodeando o meu espanto
com afagos que queimavam
caminhavas como quem grita
coroavas como quem ama
para logo te afastares
tímido agora
tantos e tantos anos de palco
e a modéstia inteira
mas onde quer que eu te visse
aquele chão era teu
todo teu
a liberdade era minha
toda minha
arresto doble, corazón
Nombre
ya lo sabés, escribirlo, escribirlo hasta que se vaya!
al diablo la calidad y la métrica!
al diablo la ortografia y el idioma!
Todo es bueno, todo sirve
cuando comprendemos
un corazón
el tuyo
todo se hace claro,
bonitooo!
te encuentro de tantas maneras ahora...
vos sabés
y sabés como de un verso al otro
todo cambia
así que ayúdame a escribirlo
hasta que se vaya
a cuatro manos y un corazón
hasta que se vaya la nube de hierro
este horrible descompás
que nunca previmos
te sabía ahí y
a veces me iba
porque te sabía ahí
a veces me hago hoja cuando sopla el viento
y sigo caminos que son solo mios
otras veces me nacen raíces
que nada arranca
que miedo nos dá, a los vagabundos, un solo lugar!
ese lugar onde estás vos, es libre?
se puede ser hoja y arból al mismo tiempo?
hay buena sombra, largos caminos y buen piso para ronda de dos?
y se puede imaginar, creer en otra cosa y entristecer un poco alguna vez?
de un verso al otro, todo cambia
se me olvidó, perdona
siempre estabas
siempre estarías
y ahora hago preguntas al caos
hasta luego, solcito
al diablo la calidad y la métrica!
al diablo la ortografia y el idioma!
Todo es bueno, todo sirve
cuando comprendemos
un corazón
el tuyo
todo se hace claro,
bonitooo!
te encuentro de tantas maneras ahora...
vos sabés
y sabés como de un verso al otro
todo cambia
así que ayúdame a escribirlo
hasta que se vaya
a cuatro manos y un corazón
hasta que se vaya la nube de hierro
este horrible descompás
que nunca previmos
te sabía ahí y
a veces me iba
porque te sabía ahí
a veces me hago hoja cuando sopla el viento
y sigo caminos que son solo mios
otras veces me nacen raíces
que nada arranca
que miedo nos dá, a los vagabundos, un solo lugar!
ese lugar onde estás vos, es libre?
se puede ser hoja y arból al mismo tiempo?
hay buena sombra, largos caminos y buen piso para ronda de dos?
y se puede imaginar, creer en otra cosa y entristecer un poco alguna vez?
de un verso al otro, todo cambia
se me olvidó, perdona
siempre estabas
siempre estarías
y ahora hago preguntas al caos
hasta luego, solcito
sábado, 19 de maio de 2018
quadra viva
não se sabe desde há quanto
se choram os mortos assim
tacteando o mistério
adiando o fim
se choram os mortos assim
tacteando o mistério
adiando o fim
Uno
deixámos o ver e o ouvir
e fomos em busca desse sentir
que Marino canta como perdido
que Marino canta como perdido
apenas para que o vamos buscar
Prece
quantas vezes te disse
todo o tempo do mundo
era a nossa medida
mão-cheia de tudo
temos todo o tempo do mundo
teremos todo o tempo do mundo
não era soberba, nem desafio, ó Deuses!
não era menosprezo pelas vossas sábias leis
que rodam e rodam e rodam sem olhar a quem!
era outra coisa
era a nossa lei
a única lei das mulheres e dos homens que se encontram
sentem-se um pouco
larguem as setas e as rodas e vejam-nos bem
o que seria de vós sem os nossos corpos e emoções?
o que seria de vós sem as nossas promessas e esperanças?
poupem a roda a quem está por Eros ferido
poupem a roda a quem o reconheceu e escancarou o peito!
prometemos nada dizer.
todo o tempo do mundo
era a nossa medida
mão-cheia de tudo
temos todo o tempo do mundo
teremos todo o tempo do mundo
não era soberba, nem desafio, ó Deuses!
não era menosprezo pelas vossas sábias leis
que rodam e rodam e rodam sem olhar a quem!
era outra coisa
era a nossa lei
a única lei das mulheres e dos homens que se encontram
sentem-se um pouco
larguem as setas e as rodas e vejam-nos bem
o que seria de vós sem os nossos corpos e emoções?
o que seria de vós sem as nossas promessas e esperanças?
poupem a roda a quem está por Eros ferido
poupem a roda a quem o reconheceu e escancarou o peito!
prometemos nada dizer.
sexta-feira, 18 de maio de 2018
Nico...
a outra ponta do laço
tinha-la tu
se soubesses o que custa
tenho a certeza que voltavas
tomando mate no pátio da casa
voando em zamba ao meu encontro
e depois juraríamos de novo pelo presente
o mais sagrado de todos os tempos nossos
tempo do sentir
tempo do querer
é absolutamente inútil pôr em verso
o que a morte nos roubou
nenhuma palavra chegou para dizer a felicidade
nenhuma palavra chega para dizer a perda
eu não tinha outra ambição
queria apenas não morrer
antes de te voltar a ver
não sou capaz de entender o que significa
já não estares
se eu estou
tinha-la tu
se soubesses o que custa
tenho a certeza que voltavas
tomando mate no pátio da casa
voando em zamba ao meu encontro
e depois juraríamos de novo pelo presente
o mais sagrado de todos os tempos nossos
tempo do sentir
tempo do querer
é absolutamente inútil pôr em verso
o que a morte nos roubou
nenhuma palavra chegou para dizer a felicidade
nenhuma palavra chega para dizer a perda
eu não tinha outra ambição
queria apenas não morrer
antes de te voltar a ver
não sou capaz de entender o que significa
já não estares
se eu estou
quarta-feira, 16 de maio de 2018
tempo inteiro
há uma canção árabe antiga que se parece com o teu silêncio
espera devagar que as cordas desenhem
nos dedos do tempo
as minhas mãos
no Goya
às 6
espera devagar que as cordas desenhem
nos dedos do tempo
as minhas mãos
no Goya
às 6
segunda-feira, 14 de maio de 2018
A Inauguração
chegámos ao fim dos tempos
explode-me o peito de não ter palavras
que te levantem para que ouças que afinal
a pedra da injustiça não ergueu paredes
a bala silva só a canção do surdo
e nunca a nossa
nós, os que ouvimos
nós, os que sentimos
amarga-nos o gosto do metal e
sangramos quando feridos
a lança ou palavra
pesa-me que não te levantes
queria dizer-te que sinto os lábios secos
com tanta poeira da história
sei e sinto o gosto do sangue
de quem ainda fica um pouco mais
e se despede devagar da ilusão do chão comum a que chamamos humanidade
mordo os lábios devagar e desfraldo a única bandeira a inaugurar
o único lugar soberano, chão de mar e vento
que nunca mais poderei nomear
cai o pano largo
Gaza-Lisboa, 14 de Maio de 2018
sábado, 28 de abril de 2018
El Faro
contame
conta-me como são os caminhos
que ligam a rue du temple
a villa urquiza
decime
diz-me que compás
é a palavra-medida perfeita
para quem tragou o mar todo
e agora orienta a mão de apoio
para o coração quente quando nevava
e os olhos perdidos para o pássaro de prévert
acordate
conjuga-nos só em tempos verbais
que caibam na rosa-dos-ventos
volta completa de horizonte
em busca de sentido
abril-sempre.
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